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Artigos,  Tecnologias Disruptivas

O medo (real) de golpes em aplicativos bancários no celular: o que está por trás e como se proteger

Em um mundo onde o celular virou extensão do corpo, o medo de cair em golpes bancários por meio dos smartphones deixou de ser exagero e passou a ser uma realidade cotidiana. Com uma combinação de fragilidade tecnológica, crescimento da criminalidade e falhas institucionais, o Brasil se tornou terreno fértil para golpes financeiros digitais. Neste artigo, mergulhamos nas causas, consequências e medidas de proteção relacionadas ao uso de aplicativos bancários em celulares.

A ameaça começa com o roubo do aparelho

Segundo o Anuário Brasileiro de Segurança Pública 2024, mais de 442 mil furtos de celulares foram registrados no país em 2023. Embora tenha havido uma queda de 10,1% em relação ao ano anterior, os números continuam alarmantes. Na cidade de São Paulo, um celular é roubado a cada cinco minutos. E engana-se quem pensa que o interesse do criminoso está apenas no aparelho em si — o verdadeiro objetivo, cada vez mais, são os dados financeiros e contas bancárias da vítima.

Samira Bueno, diretora-executiva do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, aponta que, dependendo da habilidade técnica do ladrão, o roubo pode render muito mais do que o valor de mercado do celular. Com o aparelho desbloqueado, criminosos acessam aplicativos como WhatsApp, redes sociais e apps bancários. Estes últimos, mesmo protegidos por senhas ou biometria, não são à prova de falhas.

Fragilidade dos apps e a crítica à indústria tecnológica

Especialistas alertam que as empresas de tecnologia — especialmente fabricantes de smartphones e desenvolvedores de aplicativos bancários — não estão acompanhando a sofisticação dos criminosos.

O colunista de tecnologia Thassius Veloso, da GloboNews, foi direto: “Empresas brasileiras não estão prontas para lidar com isso.” Ele critica o foco em funcionalidades supérfluas enquanto recursos essenciais de segurança são negligenciados, especialmente em países com alta criminalidade como o Brasil.

A cientista da computação Nina da Hora reforça: “Nunca se fez tão necessário o investimento em análise de risco em aplicativos bancários e dispositivos móveis.” Ela questiona por que bancos liberam empréstimos vultuosos em horários suspeitos, sem verificar o perfil da movimentação do cliente.

Na mesma linha, o cientista da computação Marco Gomes, que trabalhou na empresa de segurança Palantir, é taxativo: detectar transações suspeitas é trivial, e a falha está no interesse (ou ausência dele) por parte das instituições financeiras.

Golpes cada vez mais sofisticados (e frequentes)

Como os golpes ocorrem variam, mas muitos têm início após o acesso ao celular da vítima. Veja alguns dos mais comuns:

  • Golpe do Pix: indução a transferências instantâneas sob falsas alegações.
  • Clonagem de WhatsApp: o criminoso se passa por um contato da vítima e pede dinheiro.
  • Falso suporte técnico: o golpista finge ser funcionário de banco ou empresa de tecnologia.
  • Falso empréstimo: ofertas falsas de crédito que exigem pagamento prévio.
  • Golpe do relacionamento (catfishing): perfis falsos para enganar emocionalmente e financeiramente.
  • Phishing/smishing: mensagens com links fraudulentos que roubam dados.

Medidas que os cidadãos têm tomado por conta própria

Sem confiar totalmente nas instituições, muitas pessoas estão adotando táticas próprias para se proteger. Entre as mais comuns:

  • Não carregar o celular à noite em áreas de risco.
  • Remover aplicativos bancários dos celulares usados no dia a dia.
  • Configurar limites baixos de transações, especialmente por aproximação.
  • Usar dois celulares: um “de verdade” e outro velho, para entregar em caso de roubo.
  • Ativar bloqueios e rastreamento remoto pelo iCloud (Apple) ou Find My Device (Android).

Essas estratégias, no entanto, são apenas paliativas. O problema é sistêmico e exige mudanças institucionais e tecnológicas profundas.

A responsabilidade legal é dos bancos

Segundo a Súmula 479 do Superior Tribunal de Justiça (STJ), os bancos têm responsabilidade objetiva sobre prejuízos causados por fraudes e golpes em suas plataformas. O mesmo é reforçado pelo artigo 14 do Código de Defesa do Consumidor, que impõe ao fornecedor de serviços a obrigação de reparar danos independentemente de culpa.

Isso significa que, além de ressarcir o valor roubado, os bancos podem ser condenados a pagar indenização por danos morais, caso se comprove falha na prestação de serviços de segurança.

Iniciativas governamentais e o “Celular Seguro”

Em resposta ao crescimento dos crimes, o Governo Federal lançou o Programa Celular Seguro, visando combater o mercado ilegal de celulares. Uma das ferramentas é o envio de mensagens automáticas via WhatsApp para aparelhos cadastrados como roubados, furtados ou perdidos. O alerta orienta a devolução do dispositivo ou comprovação da propriedade legal.

Além disso, o cidadão pode consultar gratuitamente a situação de um celular pelo número do IMEI, nos sites:

Essas ações visam desmantelar redes de receptação e proteger o consumidor de boa-fé.

Como se proteger (de verdade)

Além das táticas individuais, há medidas de segurança digital essenciais:

1. Cuidado com senhas

  • Nunca salve senhas no celular ou em anotações desprotegidas.
  • Use gerenciadores de senha como o Bitwarden, 1Password ou o próprio Google Password Manager.

2. Ative a autenticação de dois fatores (2FA)

  • Essencial em apps bancários, redes sociais e e-mails.
  • Use apps como Google Authenticator ou Microsoft Authenticator.

3. Use cartões virtuais

  • Para compras online, utilize cartões que mudam o número a cada transação.
  • Isso reduz o risco de uso indevido em apps como Uber, iFood e outros.

4. Atualize sempre seu aparelho

  • Mantenha o sistema operacional e os aplicativos atualizados para corrigir brechas de segurança.

5. Evite clicar em links suspeitos

  • Especialmente em mensagens SMS ou e-mails não verificados.
  • Nunca informe dados pessoais ou bancários fora dos canais oficiais.

6. Tenha um plano de emergência

  • Em caso de roubo, bloqueie o aparelho, acione operadora com o IMEI, comunique os bancos e mude senhas imediatamente.
  • Faça um boletim de ocorrência e registre no Banco Central, se necessário.

O medo de golpes em apps bancários não é paranoia — é reação legítima a um cenário em que a segurança digital ainda não acompanha a complexidade da vida moderna. Combinando prevenção individual, cobrança institucional e pressão por inovação tecnológica, é possível tornar o celular um aliado — e não uma porta de entrada para criminosos.

Enquanto o sistema não evolui, é o cidadão quem paga o preço da insegurança. Por isso, mais do que nunca, informação é proteção. E nesse caso, estar um passo à frente dos golpistas pode ser a única forma de manter seu dinheiro e seus dados em segurança.

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